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Entregaram-te enfim à paz do cemitério,
Deixaram-te na cova o corpo delicado,
E a funda escuridão enorme do Mistério
Para sempre engoliu-te, ó lírio desfolhado!

Agora, na umidade aspérrima do solo,
Terás para abrigar-te o derradeiro sono
- Em vez do olhar materno e do materno colo -
A tristeza glacial de um lúgubre abandono.

E lá - ir-te-ão roçar a alvíssima epiderme,
E, roendo-te a carne, apodrecer-te os ossos,
O contato nojento e túrbido do verme,
E as negras podridões dos charcos e dos poços.

E enquanto adormecida à sombra desolada
Dos ciprestes, tua carne apodrentar-se, as feras
Hão de sorver a luz ao cálix da alvorada
E hão aspirar o aroma às frescas primaveras.

E enquanto na funérea escuridão dormires,
A terra há de sorrir nas expansões da flora,
Hão de enfaixar o céu as cores do arco-íris,
E o sol há de fulgir nas púrpuras da aurora.

E tu... não hás de mais colher pelos caminhos
A rubra flor aberta à madrugada; e à ave
Não mais imitarão a música dos ninhos
As doces vibrações de tua voz suave!

Amanhã tu serás o lodo de um monturo,
Uma caveira a rir um riso de idiota;
E surgirás no limo, e hás de ser verme impuro,
E virás na erva ruim que a sepultura brota...

Embora! Terás sempre a alvura do alabastro
À vista espiritual de uma ilusão materna...
Ao olhar de tua mãe tu serás sempre um astro
Esculpido no azul de uma saudade eterna!

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